IGP-M não é obrigatório nos contratos
Tapai Advogados | Em 8 de dezembro de 2023
Especialistas comentam que o brasileiro se acostumou a usar o índice nos reajustes, mas pode e deve negociar.
Saiu o Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M) do mês de novembro. Nesta 4ª feira (29.nov), a Fundação Getúlio Vargas (FGV) divulgou que a inflação medida por este indicador subiu 0,59%. Mais do que os 0,5% do mês de outubro e muito mais do que em novembro do ano passado, que teve queda de 0,56%. Até aí, tudo faz parte do jogo. O curioso é que, mais uma vez, houve quem chamasse — inclusive veículos de imprensa — esta medida dos preços de “inflação do aluguel”, como se o IGP-M fosse o indicador “oficial” pra se reajustar os contratos entre inquilinos e proprietários. Só que não é.
” Inflação do aluguel é um apelido que deram ao IGP-M, muito tempo atrás, e que o brasileiro se acostumou a usar mesmo com o passar do tempo”, classifica Marcelo Tapai, especialista em direito imobiliário e sócio do Tapai Advogados.
Parte e parte
Não há nenhuma lei que exija que o índice da FGV seja obrigatório nos entendimentos entre quem é dono de imóvel e quem quer morar neles – por tempo definido. Na prática, o IGP-M passou a ser usado e “foi ficando”. “Antes do Plano Real (1994) as curvas do IPCA e do IGPM eram praticamente idênticas pra medir a inflação”, conta o professor da FGV/RJ, André Braz, coordenador dos índices de preços da Fundação. Confira o gráfico entre os dois indicadores disponibilizado pelo professor Braz:
É importante lembrar que, antes do Real, a inflação passava da casa dos ‘milhares por cento’: no gráfico, em maio de 1990 ela beira 7.000,00% tanto no IGP-M quanto no IPCA. E assim foi até o plano mostrar sua capacidade para domar os preços, nos anos seguintes. Por que então escolher o IGP e não o outro ?
” O IGP-M tinha umas vantagens: sempre divulgado no penúltimo dia útil do mês [como é até hoje], vários dias antes do IPCA, logo, era mais rápido calcular os reajustes dos contratos; era um índice de uma instituição privada [FGV] e não pública. Muita gente considera os indicadores públicos vulneráveis a incorreções, o que é obviamente uma avaliação injusta. De qualquer forma, não seria o caso do IGP” , explica André Braz, FGV
De lá pra cá
Debelada a inflação, os índices se separaram e bem. O IPCA mais voltado aos preços ao consumidor, e o IGP-M com muita influência de mercados baseados em dólar, como o de commodities minerais (cobre, alumínio) e agrícolas (milho, algodão, café) que acompanham preços internacionais e, por isso, ‘importam’ custos de fora do país para o índice. Resultado, o IGP-M frequentemente fica muito maior do que o IPCA. Um exemplo ocorreu no auge da pandemia. O IGP chegou a bater 37,04% em 12 meses, a maior marca em 26 anos [até então], enquanto o IPCA estava em 3,22% estocados no mesmo período de 12 meses – que é a medida sempre usada para atualizar os contratos.
Tanto os dois índices mencionados quanto o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC – IBGE), o Índice de Preços ao Consumidor (IPC – Fipe/USP) e outros poderiam ser adotados em qualquer contrato de locação – tanto entre pessoas físicas quanto jurídicas. E aí os especialistas no tema apontam um elemento que é considerado obrigatório, este sim, em qualquer acordo: o entendimento entre os dois ‘lados do balcão’. ” As partes têm que entrar numa negociação. Qualquer índice acordo entre ambos pode ser usado. Só não pode ser vinculado ao dólar e ao salário-mínimo”, aponta Marcelo Tapai.
Botar na mesas as condições mais honestas para cobrar e para mostrar a capacidade de pagamento do aluguel é o caminho apontado com mais frequência pelos especialistas. Um exemplo de aplicação ocorre quando, por exemplo, um contrato com base no IGP-M chega ao período de reajuste após um ano em que o índice registra uma deflação, uma queda explícita de preços. Seria o caso agora. Veja o gráfico abaixo.
De novembro do ano passado pra cá, o IGP-M acumula queda de 3,46% – a mais intensa deste ano. Seria de se esperar uma redução no preço do aluguel? Até pode ser, mas como sempre, o melhor caminho é buscar um acordo com o proprietário: de forma geral, pode até não sair um abatimento, mas fica bem equilibrado se não houver reajuste nem pra mais nem pra menos. A tendência é que, assim, seja possível atender ao proprietário e a quem aluga o imóvel. E tática semelhante pode funcionar a qualquer tempo. ” Nada impede que durante o contrato as partes negociem. Seja qual ponto for, mantida a razoabilidade, tudo pode ser discutido a qualque tempo. Só é indispensável observar que, aquilo que for firmado em discussão entre os dois lados deverá ser aditado em contrato e, a seguir, deverá ser cumprido”, afirma Tapai.
A acrescentar
A partir do início de 2019, a Fundação Getúlio Vargas elaborou um novo índice, focado especificamente no mercado imobiliário. O Índice de Variação de Alugueis Residenciais (IVAR). Ele se baseia objetivamente em valores que constem de contratos definidos entre locatários e locadores, e não em anúncios de vagas, por exemplo. A busca é por dar exatidão aos cálculos e preços a serem cobrados e, ao mesmo tempo, não alimentar a inflação e os exageros de mercado.
” É importante que se busque, de parte a parte, estimular a economia a se desindexar, não deixar pressões para os preços do futuro -que são sempre repassadas na forma de alta do custo de vida. Quanto mais preciso for o índice ao acompanhar o que é praticado no mercado, mais importante a contribuição, para não dar fôlego à inflação e ajudar inquilinos e proprietários a se encontrarem e a se entender” – André Braz, FGV