E se a construtora falir?
Tapai Advogados | Em 17 de agosto de 2014
RIO – Marco Antonio Ribeiro de Almeida comprou um pacote de viagens para três pessoas no valor de R$ 10 mil, para visitar Cancún, no fim deste ano, mas depois de pagar duas parcelas a operadora contratada, a Marsans, encerrou as atividades por problemas financeiros. Ele ainda está tentando reverter o prejuízo.
Maria de Fátima Rodrigues Nazaré ficou sem a mochila recém-comprada na Balneário, do Top Center Ipanema. Quatro dias após a compra, o produto descosturou e ela o levou para conserto na loja, mas esta fechou as portas antes de entregar a mercadoria reparada. Denise Quintanilha quase ficou sem a estante comprada na Squadros, do CasaShopping na Barra da Tijuca, porque a loja também fechou antes de o produto ser entregue. Foi ressarcida pelo centro de compras, que na ocasião se responsabilizou pelo prejuízo.
Esses casos mostram o quanto o consumidor é vulnerável diante da falência ou fechamento de uma empresa com a qual fez negócio. Especialistas em proteção ao consumidor explicam que a vulnerabilidade reside em duas questões: não há legislação específica que proteja o comprador ou contratante nesses casos e, geralmente, os donos dos negócios não têm bens em seus nomes a serem convertidos em ressarcimento e indenizações.
Marta Aur, assessora técnica do Procon-SP, diz que a recuperação do prejuízo é mais difícil quando a empresa declara falência. Neste caso, o consumidor tem de contratar advogado para se habilitar à massa falida e receber o que lhe é devido. Isso se tiver sorte, pois é o último da lista de credores: pela ordem, são privilegiados fornecedores, trabalhadores, bancos e arrecadadores de impostos. E há um agravante, ressalta a advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) Cláudia Pontes Almeida:
— Os primeiros a serem pagos são os credores preferenciais. Então, caso o valor arrecadado com os bens da empresa não seja suficiente para quitar todas as dívidas, isso pode ser um empecilho para que o consumidor receba.
O consumidor só tem prioridade no recebimento junto à massa falida no caso da aquisição de imóvel, como na Encol, explica o advogado Marcelo Tapai, especialista em direito imobiliário. Mesmo assim, não há garantias, alerta:
— Imóvel na planta é sempre um risco, pois você está comprando um projeto. O que é comum ocorrer, quando uma construtora decreta falência antes de entregar o imóvel, é os condôminos se reunirem e decidirem assumir a construção. Nesse caso, precisam quitar as dívidas existentes e arcar com os custos para finalizar a obra, o que nem sempre é vantajoso.
Fabricante pode ser acionado
Segundo Cláudia, se o consumidor tiver pago integralmente por um serviço não realizado ou se ainda tiver alguma indenização a receber, é necessário recorrer à Justiça. Caso o serviço ainda não tenha sido realizado e ainda falte pagar algumas parcelas, o Idec recomenda procurar um Juizado Especial Civil (JEC) e propor uma ação com pedido de liminar para sustação dos cheques ou das parcelas a vencer no cartão de crédito ou boleto bancário. Foi o que pleiteou Almeida à administradora do cartão. Ele conseguiu cancelar as parcelas restantes do pagamento da viagem, e a administradora analisa a possibilidade de reembolsá-lo pelas que já foram pagas, já que a Marsans está em recuperação judicial.
— Se tudo der certo, só não vou conseguir reaver os quase R$ 900 que paguei diretamente à Marsans. Já entrei em contato com a operadora, que sempre diz que vai pagar, mas nunca paga. O certo é que não vou mais fazer viagem alguma usando serviço de agência. Vou contratar tudo direto — afirma Almeida.
Caso a loja apenas encerre suas atividades sem entrar em falência, o consumidor lesado pode pedir na Justiça a desconsideração da personalidade jurídica da empresa, para que o dono ou sócios sejam responsabilizados por seus prejuízo e paguem as dívidas por meio de seus bens pessoais.
— O problema, neste caso, é que dificilmente essas pessoas têm bens em seu nome ou condições financeiras de ressarcir o consumidor — pondera Marta, assessora técnica do Procon-SP.
Se o problema for defeito do produto, a responsabilidade pelo reparo é da rede ou do fabricante. Por isso é importante guardar a nota fiscal, lembra a advogada do Idec. Maria de Fátima, porém, não pôde se beneficiar disso porque a mochila era de fabricação própria da Balneário:
— Estou chateada, pois usei a mochila apenas uma vez. Encontrei a dona da loja em uma rede social, mandei três recados, mas ela não respondeu. Tenho um papel assinado pela vendedora, mostrando que foi para o conserto.
Denise diz que aprendeu a lição depois de quase ficar sem sua estante. Para receber o móvel pelo seguro do CasaShoppping, ela e o marido tiveram que localizar o fabricante do móvel.
— Quando nos mudamos e tivemos de comprar novos móveis, vasculhamos sites de reclamação — conta.
O GLOBO não conseguiu localizar os donos das lojas Balneário e Squadros. O CasaShopping não oferece mais o seguro que beneficiou Denise.